Brasil

“Terra Fértil (em memória de Marielle Franco)”, por Carolina Rocha

Gritaram-me louca, agressiva, petulante e metida a sabida!
Xingaram-me pelo que era, pelo que sou e pelo que ousaria ser.
Entregaram-me de bandeja ao escárnio, ao medo e a renúncia.
Impediram-me, muitas vezes, de chegar mais longe, de ir além.
Trancafiaram-me em seus porões, escuros e úmidos, e me chamaram de suja,
Porque a sujeira é preta, e preta é a minha cor.
Desejaram meu fim.
Puseram as mãos cheias de espinhos no meu Orí.
Sangraram a minha cabaça, sagrada existência, enfim.
Decretaram meu fim.
Apodreceram as raízes firmes do meu Baobá e esperaram para me ver cair.
Derrubaram-me na terra.
Corpo estendido, machucado e partido.
Desintegrada, fui adubo, esterco e caminho.
Não desapareci.
Alimentei o solo com minha carne e dei frutos.
Uma geração de mulheres, múltiplas e muitas, pretas, brancas, indígenas, lésbicas, trans, putas, bruxas, combativas
Erguidas a pedra, peito e pó, resiste em mim!

Carolina Rocha

Fotografia: Bernardo Guerreiro / Mídia NINJA

 

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